[Reportagem publicada na Zero Hora]
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O professor é o grande segredo
A Finlândia não atrai a atenção do mundo só por apresentar os melhores resultados em avaliações internacionais, mas por desprezar políticas colocadas em prática em outros países
Um país pequeno, com metade da população do Rio Grande do Sul, ostenta um dos melhores sistemas educacionais do mundo. Na Finlândia, estuda-se menos horas do que no Brasil, o ensino enfatiza a arte e a criatividade, não há avaliação externa das escolas e a ideia de premiar professores por desempenho é considerada nociva.Recentemente, o modelo nórdico foi eleito o melhor em um ranking no qual o Brasil ficou na 39ª posição e à frente apenas da Indonésia. Mas o paradoxo finlandês começou a chamar atenção quando ficou entre os líderes da primeira edição do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa), que mede o conhecimento de alunos desde 2000. A partir daí, o país europeu é o mais bem colocado em rankings educacionais junto a asiáticos como a Coreia do Sul.
Boa parte dos jovens coreanos, porém, estuda mais de 10 horas por dia. Os finlandeses, como ZH testemunhou ao circular por escolas daquele país, têm uma das menores cargas letivas do planeta, aprendem em colégios públicos gratuitos e descontraídos – onde tratam os professores pelo primeiro nome – e têm tempo generoso para lições de arte e trabalhos manuais. Instituições da capital Helsinque, como a Viikki ou a Helsingin Normaalilyseo, mais parecem galerias de arte onde se expõem obras produzidas por alunos.
Os professores colam fotos sorridentes nas portas de suas salas, e sentam ao lado dos alunos para a refeição diária a que todos têm direito. As aulas se baseiam em resoluções de problemas e na interatividade, como nas lições de inglês do professor Riku Mäkelä.
– Formem duplas. Um lê o texto que está no quadro, memoriza e dita para o colega escrever – orienta.
Mäkelä, que tem doutorado, conta com liberdade para planejar as aulas e fazer adaptações no currículo, podendo alterar a ordem ou a ênfase de conteúdos. Países orientados pelo modelo americano investem em um perfil mais próximo ao mundo dos negócios, com controle sobre a gestão escolar e o currículo, aposta em avaliações padronizadas de alunos, classificação de escolas e oferta de prêmios ou sanções aos professores. Os finlandeses seguem a crença de que não se cria um país bem-educado à força.
– Não desistimos das pessoas. Damos tempo aos professores para trabalharem e temos um bom sistema de apoio aos alunos – afirma o conselheiro do Ministério da Educação da Finlândia Aki Tornberg.
O pilar que sustenta o aparente milagre finlandês é a qualidade dos educadores. Os melhores alunos se candidatam aos cursos de formação igualmente públicos e gratuitos, onde devem alcançar o nível de mestrado. Com essas credenciais, não são submetidos a qualquer inspeção externa – embora sejam feitos testes por amostragem para monitorar a qualidade do sistema em geral. Alunos recebem atenção individualizada ao primeiro sinal de dificuldade.
A repetência caiu de 50% nos anos 1970 para menos de 2%. Na Finlândia, o investimento por aluno é 30% inferior ao dos americanos, por exemplo. Uma questão em aberto é o quanto do surpreendente modelo nórdico pode ser adaptado a outras culturas e dimensões nacionais. Essa pergunta, porém, cabe ao resto do mundo responder.
*O repórter viajou a convite da Embaixada da Finlândia no Brasil
marcelo.gonzatto@zerohora.com.br
MARCELO GONZATTO* | Helsinque, Finlândia
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Como aprender com o modelo finlandês
O governo gaúcho tem intenção de se aproximar da Finlândia para conhecer melhor o sistema nórdico. Embora ainda não exista um projeto formalizado de intercâmbio, a Secretaria Estadual da Educação (SEC) se interessa principalmente pela forma como os europeus lidam com as avaliações – utilizando-as como referência, mas não para estabelecer rankings ou pagar professores.– Temos interesse em conhecer melhor o funcionamento desse sistema, principalmente a avaliação, que é muito diferente da nossa. Não valorizam os testes como elemento definidor da qualidade. O definidor é a capacidade do indivíduo de resolver problemas, enfrentar desafios e liderar – afirma o titular da SEC, Jose Clovis Azevedo.
O estímulo à iniciativa pode ser exemplificado por estudantes da escola Viikki como Ida Virta e Nelli Wiksten, 16 anos. A fim de custear um passeio escolar a Berlim (Alemanha), as colegas usam espaços do colégio secundário onde estudam como oficina para a produção de cartões natalinos que serão vendidos na comunidade. Com o recurso, pretendem fazer a viagem.
– Dá bastante trabalho, mas é bom – conta Nelli.
Criatividade, arte e trabalhos manuais fazem parte do currículo finlandês. Mas, para que o ensino das disciplinas mais tradicionais não seja comprometido, o modelo depende de figuras como a professora em treinamento Gutta Laaksonen, 25 anos. Ela já tem um mestrado e agora busca sua segunda pós-graduação para lecionar para as séries iniciais. Na adolescência, pensou em seguir outras carreiras, mas a admiração que a profissão de educador desperta na sociedade finlandesa e sua história familiar foram determinantes:
– Minha mãe, minha avó e uma tia escolheram ser professoras. O que me move não é o dinheiro, mas o fato de ser uma profissão muito admirada.
A representação diplomática do Brasil na Finlândia afirma que está em fase inicial um projeto para enviar alunos universitários de pedagogia brasileiros para complementar os estudos naquele país. Porém, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) se limita a informar de que ainda não foi tomada nenhuma iniciativa oficial.
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Alguns meses atrás assisti à fala do Embaixador da Finlândia na Câmara dos Deputados em Brasília. A palestra era sobre migrações e educação. O Embaixador contou a história da Finlândia e do papel da educação na definição da identidade finlandesa. Mencionou, por exemplo, que, no século XIX, quando alguém queria se casar, precisava provar que sabia ler, pois entendia-se que só alguém letrado poderia ser um cidadão informado e capaz de cuidar adequadamente de uma família.
ReplyDeleteEle mencionou que, na Finlândia, os professores não são os que ganham mais, porém, são os mais valorizados. Existe respeito social pelo professor, o que é reforçado pelo fato de que só os melhores alunos se tornam professores, pois a formação de professor dura vários anos e eles precisam se qualificar constantemente.
Na mesma palestra, também estava uma deputada brasileira, Profª Rosinha, que salientou o paralelo de que, no Brasil, é o contrário: aqui, são os piores alunos que se tornam professores, sobretudo da educação básica e infantil, pois os bons alunos não vão se arriscar em uma profissão socialmente desvalorizada e de péssima remuneração.
Vimos que, na Finlândia, não é o salário relativo que determina a qualidade dos professores, mas a valorização social. Um país que exigia alfabetização até para a pessoa poder se casar é bem diferente do nosso, onde o Estado pouco se preocupa em valorizar o professor. Muitos professores de ensino básico não sabem sequer ligar um computador e desconhecem o uso da Internet. Como eles podem educar crianças e ensiná-las a buscar informação? Aí vem o governo e fala em inclusão digital sem fazer algo muito mais barato do que fibra óptica, que é, simplesmente, conhecer o professor e suas necessidades...
Boa educação começa pela valorização cultural da educação e pela valorização social do professor. Essa valorização não existe em um país onde os parlamentares rejeitaram a aplicação dos recursos do pré-sal na educação e onde certamente serão reeleitos por um povo que nem se lembra em quem votou dois meses atrás.
Só não concordo com o discurso da professora e deputada brasileira Rosinha de que os piores alunos são professores no Brasil. Se assim for, que tal colocá-la no topo desta lista?
ReplyDeleteVerdade Lucas, conheco professores que, apesar de tudo, amam sua profissao e sao realmente boms.
ReplyDeleteMuito bom mesmo esse exemplo da Finlândia, pena que no Brasil jamais iriam fazer isso.
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